Célestine
Há quem tome comprimidos para a diabetes, para o
coração, para o colesterol... Há também quem tome comprimidos para
morrer e quem tome comprimidos para matar. Há ainda quem não tome
comprimidos, nem para a diabetes, nem para o coração, nem para o
colesterol, nem para morrer ou para matar. Provavelmente, só para sobreviver...
Até que as pedras se tornem mais leves do que a água,
como diz António Lobo Antunes. Ou até que uma nova alma húmida seja capaz de nos resgatar de
certa solidão existencial.
Enfim, deverei tomar algum comprimido para não
morrer?
Célestine (Léa Seydoux), em
Dário de uma criada de quarto, de Benoît Jacquot, 2015.
Direcção de fotografia de
ROMAIN WINDING
— Menina Célestine, tenho um excelente lugar
para si. Mas terá que ir para a província...
— Para a província? Não me entusiasma
muito.
— Não conhece bem a província. Há lá
excelentes lugares.
— Excelentes lugares... que anedota! Não
há excelentes lugares.
— Perdoe-me, menina Célestine, mas não há
maus lugares...
— Eu sei. Apenas maus patrões.
— Não. Apenas más criadas! (...)
Arranjo-lhe as melhores casas, não tenho culpa que não permaneça lá.
Além do mais, é inteligente. Tem presença. Tem uma bonita cintura,
uma boa figura, poderiam acontecer-lhe coisas felizes, com uma boa
postura.
— Com ausência de postura, quer dizer.
— Depende do ponto de vista. Eu chamo a
isso uma boa postura...
— Pronto, deixe lá, prometo-lhe ter boa
postura, como a senhora diz. Boa postura é o que mais tenho,
garanto-lhe. Pode ficar descansada.
Journal d´une Femme de Chambre
Benoît Jacquot, 2015.
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POST SCRITPTUM/ Jornal de Notícias,
hoje [ 21 de Abril 2018]:
«No popular site de anúncios britânicos "Craiglist" são
publicados, por dia, mais de 100 anúncios com propostas para
partilhar casa em troca de "relações sexuais duas ou três vezes
por semana", ou "raparigas atrevidas para um quarto...»
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