contacto

poesia

fotografia

home

 

  Post 035 -  Junho de 2010  

 

foto: Carlos Vilela 2010

 

www.anterodealda.com

 

 

pesquisar neste blog

 

Recentes

 

o editor pergunta-me...

          [ a reserva de Mallarmé ]

 

 

Antigas

 

o ministro foi às putas de pequim

manual de sobrevivência [ XXV ]

o comboio de... Cristina Peri Rossi

o tesoureiro de Leipzig

manual de sobrevivência [ XXIV ]

manual de sobrevivência [ XXIII ]

manual de sobrevivência [ XXII ]

e o lado oculto da Europa...

a Espanha oculta de...

          [ Cristina García Rodero ]

o cortejo dos amortalhados

EU — only for rich

a essência do Capitalismo

a essência de um Capitalista

os filhos do Diabo

manual de sobrevivência [ XXI ]

ódio à Democracia [ III ]

ódio à Democracia [ II ]

ódio à Democracia [ I ]

Warhol [ 85 anos ]

manual de sobrevivência [ XX ]

manual de sobrevivência [ XIX ]

manual de sobrevivência [ XVIII ]

taitianas de Gauguin

retratos de Van Gogh

nunca serei escravo de nenhum terror

as coisas [ Jorge Luis Borges ]

manual de sobrevivência [ XVII ]

manual de sobrevivência [ XVI ]

Portugal, noite e nevoeiro

o corno de Deus

manual de sobrevivência [ XV ]

manual de sobrevivência [ XIV ]

manual de sobrevivência [ XIII ]

a filha de Galileu

um museu para o Eduardo

manual de sobrevivência [ XII ]

manual de sobrevivência [ XI ]

Torricelli, Pascal, Hobbes, razão, utopia e claustrofobia

manual de sobrevivência [ X ]

manual de sobrevivência [ IX ]

os diabos no quintal

     [ histórias de homens divididos

       entre muitos mundos ]

o pobre capitalismo...

as Madalenas de Caravaggio

manual de sobrevivência [ VIII ]

o alegre desespero [ António Gedeão ]

manual de sobrevivência [ VII ]

manual de sobrevivência [ VI ]

manual de sobrevivência [ V ]

manual de sobrevivência [ IV ]

manual de sobrevivência [ III ]

sombras [ José Gomes Ferreira ]

Phoolan Devi [ a valquíria dos pobres ]

schadenfreude [ capitalismo e inveja ]

a vida não é para cobardes

europa

a III Grande Guerra

FUCK YOU!

EU — die 27 kühe [ as 27 vacas ]

europa tu és uma puta!

bastardos!

o daguerreótipo de Deus...

o honrado cigano Melquíades...

cem anos de solidão...

manual de sobrevivência [ II ]

o salvador da América [ Allen Ginsberg ]

o salvador da América [ Walt Whitman ]

[ revolução V ] as mães do Alcorão

[ revolução IV ] paraíso e brutalidade

[ revolução III ] andar para trás...

[ revolução II ] para onde nos levam...

[ revolução I ] aonde nos prendem...

o problema da habitação

cartas de amor

a herança de Ritsos

as piores mentiras

elegia anti-capitalista

da janela de Vermeer

manual de sobrevivência [ I ]

de novo o Blitz...

antes de morrer

as valquírias

forretas e usurários

           [ lições da tragédia grega ]

Balthus, o cavaleiro polaco

abençoados os que matam...

diário kafkiano

Bertrand Russell: amor e destroços

U.E. — game over

DSK: uma pila esganiçada

coração

kadafi

o tempo e a eternidade

Bucareste, 1989: um Natal comunista

mistério

o Homem, a alma, o corpo e o alimento

          [ 1. a crise da narrativa ]

          [ 2. uma moral pós-moderna? ]

          [ 3. a hipótese Estado ]

o universo (im)perfeito

mural pós-moderno

Lisboa — saudade e claustrofobia

          [ José Rodrigues Miguéis ]

um cancro na América

Marx, (...) capital, putas e contradições

ás de espadas

pedras assassinas

Portugal — luxúria e genética

rosas vermelhas

Mozart: a morte improvável

1945: garrafas

1945: cogumelos

bombas de açúcar

pão negro

Saramago: a morte conveniente

os monstros e os vícios

porcos e cinocéfalos

o artifício da usura

a reserva de Mallarmé

o labirinto

os filhos do 'superesperma'

a vida é uma dança...

a puta que os pariu a todos...

walk, walk, walk [Walter Astrada]

Barthes, fotografia e catástrofe

Lua cheia americana [Ami Vitale]

a pomba de Cedovim

o pobre Modigliani

o voo dos pimparos

o significante mata?

a Europa no divã

a filha de Freud

as cores do mal

as feridas de Frida

perigosa convivência

—querida Marina! («I'm just a patsy!»)

a grande viagem...

histoire d'une belle humanité

o coelhinho foragido

o sono dos homens...

«propriedade do governo»

os dois meninos de O'Donnell

o barco dos sonhos

farinha da Lua

o enigma de Deus

«nong qua... nong qua...»

«vinho de arroz...»

magnífica guerra!

a lei do Oeste...

Popper (1902-1994)

 

 

 

SnapShots

 

 

os dias todos iguais, esses assassinos...

 

 

 

 

os monstros e os vícios

 

 

 

Subscrevo o que diz hoje ao Jornal de Notícias o escritor irlandês Colm Tóibín (n. 1955): «A Europa não precisou de Bruxelas para conseguir, durante séculos, a livre circulação de ideias. Tudo mudou quando os actuais burocratas chegaram ao poder. Tentaram convencer-nos de que a cultura não é importante, mas sim a livre circulação de capitais. (...) Cada vez mais, chego à conclusão de que estamos a ser regidos por gente com espíritos dissecados.»

COLM TÓIBÍN, JN, 16 de Junho de 2010.

 

 

MICHAEL HUTTER: Die Hexenwippe oder-waage, óleo sobre tela, série Lemuria III, 2006.

 

Trabalhamos outra vez mais, durante mais tempo e em condições mais humilhantes, para que os novos monstros que nos governam possam continuar impunemente a alimentar os seus vícios.

 

 

 

 

«O cidadão, hoje, não é um homem livre, é uma peça da máquina de opressão que se chama democracia. O cidadão é um homem que acredita no que o poder lhe diz. Agora, o poder diz que há uma crise terrível causada pelo facto do cidadão ter vivido acima das suas possibilidades e a única solução é o sacrifício. É falso. A crise é a fuga para a frente de um capitalismo desenfreado. (...) Viver já não é viver, é gerir a vida que temos e convertê-la num projecto rentável. Viver, em definitivo, é trabalhar. A nossa vida está precarizada e humilhada.»

SANTIAGO LÓPEZ-PETIT

Revista Visão, 20 de Maio de 2010.

 

 

Democracia I: o homem frágil

Oeiras, 9 de Fevereiro de 2010. L.V.C., de 51 anos, levantou-se cedo, muito antes das sete da manhã, para preparar as suas aulas como era seu costume. Professor de música numa escola de Sintra, apetecia-lhe tudo menos ir para o emprego: talvez ensaiar uma partitura, visitar os Jerónimos ou dar um passeio a pé pelo Parque dos Poetas... A verdade é que L.V.C. tinha que cumprir o seu horário de professor sabendo que iria encontrar um grupo de alunos com um instinto sórdido para o desprezar, cada vez mais insolentes e indisciplinados e sem vontade de aprender.

 

Diversas vezes provocado física e verbalmente na sala de aula, desistira já de fazer mais queixas aos seus superiores: pesava-lhe agora na consciência a possibilidade de o considerarem profissionalmente inapto.

 

 

«A sardinha quer que a lata seja aberta em direcção ao mar.»

WERNER ASPENSTRÖM

 

Então, nessa manhã, saiu de casa disposto a seguir caminho em direcção ao Tejo. Entrou na ponte 25 de Abril, parou o seu pequeno Ford Fiesta a meio do tabuleiro, saiu do carro e atirou-se...

Em Novembro, havia deixado no seu computador a seguinte nota: «Se o meu destino é sofrer, dando aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras fontes de rendimento, a única solução apaziguadora será o suicídio.»

Psicólogos e colegas de trabalho afirmaram aos jornais que L.V.C. era um homem frágil.

 

 

Democracia II: as metas individuais

Rhône-Alpes (sudeste de França), 28 de Fevereiro de 2010. Monsieur C., de 51 anos, pai de duas crianças e funcionário da France Télécom, poderia ter acordado com vontade de dar uma volta pela bonita região do bourg d'Alby ou subir aos Alpes para desfrutar o ar puro da magnífica paisagem da fronteira com a Suíça. Mas não: saiu de casa de manhã cedo e pouco depois atirou-se de um viaduto. Segundo os jornais, Didier Lombard, CEO da empresa, deslocou-se de imediato ao local para iniciar negociações sobre o princípio da mobilidade forçada e para suspender as metas individuais impostas ao pessoal destacado em Annecy...

 

 

Estes casos não são únicos. Em Setembro de 2009, um professor de uma escola de Vouzela pôs termo à vida  depois de deixar a seguinte mensagem no seu portátil: «Não consigo mais continuar a ser um bom professor. Esta ministra conseguiu secar tudo o que havia de bom na profissão docente.» Nos blogues e nas redes sociais de maior impacto (Facebook, Twitter, Orkut, Hi5...) há cada vez mais relatos de «pressões no trabalho», as mesmíssimas razões que levaram nos dois últimos anos 34 trabalhadores da France Télécom ao suicídio. O mesmo que aconteceu, aliás, a 12 funcionários do sector bancário francês em 2008.

 

No seu livro 'Orange Stressé', 2009 («a laranja estressante», numa tradução directa que faz referência à empresa de telemóveis da operadora francesa — a Orange), o jornalista Ivan du Roy fez o diagnóstico da situação: a França, como a maior parte dos países da UE, está envolvida num processo de privatização das suas maiores empresas, obrigando-as a funcionar segundo estratégias do lucro e rentabilidade económica que pesam sobre a vida profissional, a vida pessoal e até a intimidade dos seus funcionários, gerando «fragilização da saúde psicológica e mental de alguns empregados e um grande sentimento de insatisfação» inerentes a situações de impossibilidade de cumprimento das metas estabelecidas pelas chefias.

 

 

 

 

Democracia III: a coragem, o trabalho e a sobrevivência

 

«que

poderiam

os poderosos

se não pudessem contar

com aqueles

que não têm poder

que poderiam

os poderosos?

 

mais poderosos

que os poderosos

seriam

seriam então

os sem poder.»

KURT MARTI

 

 

 

Lisboa, 12 de Junho de 2010. Nas comemorações dos 25 anos da adesão de Portugal à União Europeia, e na sequência da crise financeira que atravessa os países signatários, Durão Barroso, o infeliz presidente da Comissão, pede liderança e coragem política aos chefes de Estado.

 

Liderança e coragem, pois...

 

Antecipando-se, Angela Merkel, a virtuosa chanceler alemã que há poucos dias atrás acusava os países mais pobres (Grécia, Portugal, Espanha...) de não saberem gerir as suas economias internas, decidiu cortar o 13º mês aos funcionários públicos.

Ao mesmo tempo, nas comemorações do Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, a Organização Internacional do Trabalho lembrava que há em todo o mundo cerca de 215 milhões de crianças que têm de trabalhar para sobreviver.

Em resumo, quando se pensava que o trabalho [uma certa concepção de trabalho] era um dos milhões de defuntos de Auschwitz e não voltaríamos a ouvir a máxima «Arbeit macht frei», o que nos querem impor agora é infinitamente pior: quem não trabalha não sobrevive!

 

 

 

 

Democracia — epílogo: a necrose

A nosso destino parece ser este: regressados à Idade Média, temos de aprender a lidar agora com outros deuses, alimentar a sua opulência aniquiladora e viver confinados à humilhação que é servi-los com a nossa sombra para que resplandeçam de luz.

Carregando o medo de não conseguirmos realizar as tarefas que nos são impostas e sermos despedidos dos nossos empregos, trabalhamos outra vez mais, durante mais tempo e em condições mais humilhantes, para que os novos monstros que nos governam possam continuar impunemente a alimentar os seus vícios.

Até que a inevitável necrose infecte esta democracia fossilizada de séculos, com a solidão da nossa ausência ou o barulho da nossa revolta.

 

______

Educação e economia global não foram escolhidas ao acaso para esta reflexão. Edgar Morin, o sociólogo francês que publicou 'Cultura de Massas no Século XX — Necrose' (L’Esprit du Temps: Nécrose, 1975) lançou em 2009 o manifesto «pour la métamorphose du monde» e elegeu estes dois temas como prioritários para as mudanças necessárias ao modo de pensar da sociedade pós-moderna.

 

Posts relacionados

[ PORCOS E CINOCÉFALOS — A FÁBULA DO PODER ]

[ O ARTIFÍCIO DA USURA ]

[ A VIDA É UMA DANÇA ] 

[ A PUTA QUE OS PARIU A TODOS ]

 

 

 

anterior  |  início  |  seguinte

 

 

A alma tem muitos inquilinos

que estão frequentemente em casa todos ao mesmo tempo.

GÖRAN PALM

 

webdesign antero de alda, desde 2007