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BARROSO: DINHEIRO DO VENTO...
Barroso: dinheiro do vento...
«Olhe que ainda agora vim do monte com oito vacas e um boi tourão e quase vinte cabeças de rês e um jumento. A jumenta hoje não foi, que ele foi buscar uma carrada de milho com ela. E logo tornam a sair às 4 e meia/5 horas para o monte. Vêm depois às 8 horas para casa outra vez. Ainda ando com elas quase todos os dias. Ainda cheguei há pouco com elas. Foi ele... andamos a meter nas lojas, porque algumas estão paridas, têm os vitelos pequeninos, há lá um que já tem um vitelo para aí de 4 meses. Agora andam próximas mais a parir outra vez. Parem agora todas por aí fora... Temos o boi tourão... Temos tudo...»
DANIEL RUA
Arcos de Cervos, Montalegre
Agosto de 2010.
27 AGO 2010 0'46''
Filmes
Já quase não há gado. Nem linho, nem lã, nem roca. Agora a gente negoceia com o vento… As eólicas estão espalhadas por toda a montanha.
Nos campos em volta da pequena capela de Santo Isidro, no alto da Pena Franga, bem à vista dos três cornos do Barroso (os majestosos cabeços que o diabo desenhou na montanha com a forma de chifres de bovino), junta-se grande parte do gado da aldeia para ser benzido durante a procissão ou simplesmente para cumprir promessas devidas por louvores recebidos, porque aqui o povo ainda tem fé.
O padre auxiliar, antigo missionário em África que decidiu calcorrear estas serras desde Viseu, faz o elogio do santo lavrador e da festa simples, e aproveita a oratória para avisar sobre os males da cobiça e da avareza:
«Vejam o que se passa no nosso país, assaltado por uma onda de corrupção sem fim, envolvendo grandes políticos e banqueiros que não hesitam em vender a alma para fazerem fortunas incríveis à custa do suor dos pobres.»
Adivinha-se do sermão da missa de Pentecostes que o povo já não teme somente os males naturais (os fenómenos que mais impressionam a fantasia do homem: o fogo, o relâmpago, o furacão, o terramoto, os trovões... Ezeq. 37, 1-14), usados na Bíblia para contar as manifestações de Deus...
SANTO ISIDRO Alturas do Barroso, Maio de 2009.
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VILA NOVA: A CELEBRAÇÃO DA PRIMAVERA
Carnaval em Vila Nova: a celebração da Primavera
Em Vila Nova, no Barroso, a Primavera dá-se numa folha de carvalho: a oferta é levada de casa em casa e entregue em mão pelas crianças — os duendes —, que circulam entre mostrengos, velhas desconfiadas que vestem de preto, carneiros, javalis, lobos, corujas e muitos outros animais da fauna local que povoam as lendas e os contos dos antepassados.
Nesta aldeia escondida numa encosta sombria entre o Cávado e o Rabagão, às portas de Sidrós, no Gerês, e muito perto da Misarela (a famosa ponte que tem fama de boa parideira e onde Deus se cruza com o Diabo para resgatar as almas), há ruas e casas às quais o sol não chega durante três longos meses do ano.
Tânia, escolhida entre as mais vistosas e simpáticas raparigas da freguesia, veste para este ritual carnavalesco a indumentária principal, com motivos fitomórficos: raízes, musgo, caules, folhas e flores, celebrando o fim do Inverno, dos tempos da abstinência da terra e das fracas colheitas. Chamam-lhe Primavera.
CARNAVAL EM VILA NOVA Montalegre, Fevereiro de 2010.
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CIPRIANO MARTINS E JOSEFINA SEARA
Vilarinho de Negrões: Cipriano Martins e Josefina Seara
Cipriano lava a louça. Sentada no banco em frente da lareira, a sua esposa, Josefina, espera pela ambulância que a irá levar ao hospital mais próximo, a cerca de 60 km de distância; ela teve há pouco tempo um acidente vascular cerebral que a deixou paralisada. A ambulância pode vir hoje, ou depois de amanhã ou só na próxima semana.
Filmes
«Deve-se estar sempre bêbado.
É a única questão.
Afim de não se sentir o fardo horrível do tempo,
que parte tuas espáduas
e te dobra sobre a terra.
É preciso que te embriagues
sem trégua.»
BAUDELAIRE
«Ele brada cravem mais fundo na terra vocês aí cantem e toquem agarra a arma na cinta brande-a seus olhos são azuis cravem mais fundo as pás vocês aí continuem tocando para dançar.
Leite negro da madrugada nós te bebemos de noite nós te bebemos ao meio-dia e de manhã nós te bebemos de noite nós bebemos bebemos…»
Fuga da morte
«Ela sabe as palavras mas limita-se a sorrir.
Mistura o seu sorriso no cálice de vinho:
Tens de o beber, para estar no mundo.»
Sete rosas mais tarde
PAUL CELAN
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